terça-feira, 24 de janeiro de 2006

Rádio contumaz























A nova lei já aprovada, das quotas de “música portuguesa”, é ridícula. Um perfeito disparate. É mais um tiro num alvo chamado Rádio, e, pior que tudo, faz desta o bode expiatório fácil, tornando-a, uma vez mais, na vítima que dá jeito atacar. O legislador é forte com os fracos e fraco com os fortes. Uma lei ignóbil que diz que rádio é culpada. Faz dela contumaz, sem contudo lhe dar hipóteses de se defender como precisaria. Mas esta lei não se aplica à televisão…e porquê? Concordo com todos os que pensam que se trata de uma ingerência nos conteúdos das empresas de radiodifusão e choca com a liberdade de programação. Será também o governo que responderá por eventuais quedas nos níveis de audiências das estações que venham a ser prejudicadas com esta medida absurda?
Num panorama radiofónico altamente segmentado, cada vez mais estratificado e com públicos tão definidos e distintos, não faz nenhum sentido uma coisa destas! Vide por exemplo as rádios do grupo Média Capital. Como é possível meter em cada um daqueles múltiplos canais um mínimo de 25% (até 40%) de música portuguesa? E em estações do grupo Lusocanal? Estações como a Óxigenio e a Radar não vão ser danificadas com esta medida? A única estação que na minha opinião tinha e tem obrigação de emitir 100% de música portuguesa é a RDP-Antena1, mas este canal público, pese embora transmita mais música portuguesa que os restantes operadores, também veste a casaca da concorrência dos privados ao fazer o caminho das playlists.
E o que é música Portuguesa? A nova lei já nasce torta, definindo por exemplo que, música portuguesa pode ser em Inglês desde que cantada e/ou tocada por músicos portugueses.
Para mim, música portuguesa é toda e qualquer canção cantada em português, provenha ela da boca de um português, brasileiro, chinês ou jamaicano. É a língua que se ouve que define o idioma, não a nacionalidade dos artistas. E música instrumental só é música portuguesa desde que tocada por músicos de nacionalidade portuguesa.
A lei das quotas é passar um atestado de menoridade à verdadeira música portuguesa. É alcandora-la num protectorado minoritário, remetê-la a um gueto. Torna-a vítima legal. É claro que apesar de ser uma lei lesa pátria, não há só “inocentes” no processo…há quem possa e queira beneficiar com ela: em primeiro lugar uma meia dúzia de músicos desinspirados durante anos a fio e que estagnaram, ou músicos de talento duvidoso e pouco produtivo, que encontram nesta lei um passaporte de divulgação garantida sem terem que se esforçar para fazerem música a sério, pautada com mais elevados padrões qualitativos. Para quê “darem o litro” se passam à mesma na rádio? Na verdade não têm capacidade – ou não a querem desenvolver – para ombrearem de peito aberto com a música de outros que demonstram ter mais talento e qualidade. Em segundo lugar, ganham com esta lei alguns executivos das editoras, a chamada “Industria”, que querem fazer render o peixe nacional que vagueia nos seus catálogos (…de fundo). Esta lei cede ao lobby de toda essa gente que não serve a música portuguesa…antes, serve-se da música portuguesa usando a rádio. Os que se queixam que passam pouco nas rádios são os mesmos de sempre, os que passam sempre e que agora ainda vão passar mais na rádio. Os que nunca bafejaram o precioso éter continuarão a não ter oportunidade como até aqui não tiveram.
Isto é lei para engorda de algozes!
E quem vai perder? Os novos músicos, os menos novos mas muito bons, os melhores de sempre – que continuarão arredados – e, claro, os ouvintes. É o prejuízo de muitos em benefício de muito poucos. E como se vai fiscalizar eficazmente uma lei com estes contornos?
Como é costume, lá se está outra e mais uma vez a construir a casa pelo telhado. Não é assim que se defende seja o que for. Muito menos a língua e a música portuguesa.
Portugal é um país muito civilizadinho na teoria, no que toca às leis decretadas. No entanto a prática demonstra uma outra coisa, outra realidade. A maioria das leis neste país não se cumpre, tal como a famigerada e falida lei das quotas de 1981. Esta nova lei tem tudo para também não ser cumprida. Se eu fosse programador de radiodifusão não a cumpriria.

Francisco Mateus


O que eles dizem (08)

(…)
Músicos, autores e editoras viram as suas exigências merecer respostas naquela que tomaram como a sua principal frente de combate. Todavia, não se pense que com mais rádio se salva a música (e industria musical) em Portugal. De uma necessária revisão dos programas de ensino a mais uma justa política fiscal, passando por programas oficiais de apoio à exportação e revisão urgente dos preços de venda ao público pelos editores, muito há ainda por fazer.
(…)

Nuno Galopim
in revista (DN) 20/Janeiro/2006


Rádio
APR acusa lei de defender indústria fonográfica

O presidente da Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR) acusa as alterações á lei da rádio de defenderem apenas a indústria fonográfica. José Faustino diz que a imposição de quotas de música nacional ás rádios “foi claramente um jeito feito aos produtores”.


in Diário de Notícias
2ª feira / 22.Janeiro.2006



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