sábado, 11 de fevereiro de 2006

Entrevista a PEDRO ESTEVES















O programa "lado B", da autoria de Pedro Esteves, insere-se numa série de emissões que encontram espaço em rádios locais (ou regionais, se ocupam mais que uma frequência), onde é menor a miríade de obstáculos à realização de rádio em nome próprio. Mal remunerados ou mesmo não remunerados, os espaços de autoria em rádios locais espalhadas pelo país, vão do melhor ao pior. As rádios e os programas. Mas também há os de eleição, merecedores de maiores palcos. O "lado B" faz parte destes.

Em Maio de 2005 publiquei aqui um texto sobre o programa “lado B” por altura do primeiro aniversário do programa de Pedro Esteves. Agora a entrevista, quando o Podcast já é uma realidade consumada para este programa de rádio.


Como e quando aderiste ao Podcast?

Aderi ao Podcast em meados de Agosto do ano passado, imediatamente após me ter apercebido da sua existência e das suas potencialidades. Não foi um processo fácil. Demorei algum tempo a perceber como funcionava, sobretudo a criação dos “feeds” (rss), que são a base da actualização automática de ficheiros. Antes disso, o “lado B” existia já online, para download directo.

Achas que é uma ameaça à rádio tradicional ou é apenas uma mais valia como foi o aparecimento da Internet?

Ambas as coisas. Este fenómeno, ainda incipiente em Portugal, vai obrigar a rádio a mudar. É portanto uma ameaça porque a vai obrigar a mudar, o que, tendo em conta o actual panorama, é bom.

Panorama actual...o que te parece o "panorama actual"?

Miserável. As rádios são todas iguais. As pessoas vão perceber que não vale a pena ouvir uma playlist feita por outros quando a música está aí, na Internet, e que podem escolher a gosto as suas músicas preferidas. A música, que passa actualmente nas nossas rádios generalistas, chega primeiro à Internet. A rádio vai ter de se adaptar a esta realidade.

As playlists são um mal necessário? Um mal necessário para as rádios, isto é, uma espécie de concessão ou uma necessidade para a viabilidade económica por via das audiências?

Excluindo os programas de autor que, julgo eu, vão regressar, deve haver uma linha orientadora, que deve servir para definir a imagem sonora da estação. Não deve é ser estanque. Como está, é limitativa, em todos os aspectos. E quem mais perde, como sempre, são os ouvintes. É uma concessão. Serve interesses, também económicos.

Mas voltemos ao Podcast: até onde achas que vai ter este fenómeno?

Não tenho uma ideia concreta. Acho que vai crescer muito, a maioria de fraca qualidade, e depois, naturalmente, o público irá separar o trigo do joio. As rádios vão aderir ao fenómeno, porque será uma forma de fazer chegar os seus conteúdos. E da produção caseira, irão surgir talvez, novos animadores para a rádio. Também é possível que a rádio venha a emitir nas suas grelhas, programas que na sua génese são Podcasts.

O Podcast é a salvação para os autores?

O “lado B” é, de raiz, um programa de rádio, que se serve da Internet para chegar a mais gente, e mais longe. O fecho anunciado da Rádio Ocidente não vai matar o "lado B". Ele sobrevive, porque existe a Internet. A produção de programas com emissão via Podcast é talvez uma forma de os "não autores" da rádio – porque as rádios são cada vez mais espaços fechados, onde os animadores nunca são realizadores – produzirem conteúdos do seu interesse, à sua maneira.

Mas gostarias que o "lado B" continuasse no éter?

Sim, teria todo o interesse, mas não é fundamental.

Coloco a pergunta ao contrário: que interesse poderá haver em ter um programa numa estação de rádio se via Internet pode chegar mais longe e a mais gente?

Boa pergunta! No caso do "lado B", tem interesse porque ele, na sua origem, é um espaço de autor que pretende mostrar uma "alternativa" ao panorama de estagnação musical actual nas rádios. Na Internet isto não se verifica com a mesma amplitude.

Não se verifica "ainda" ou não se verificará de todo?

Não sei. O utilizador português é jovem, curioso, dado a novidades, e elas estão aí, na Internet. Se quer ou procura o “comercial”, o óbvio, o imediato, o caminho mais fácil é ligar o rádio.

És ouvinte de rádio?

Cada vez menos.

Quando começaste a ouvir e o quê?

Comecei a ouvir rádio na adolescência, fascinado com o seu potencial de comunicação. Comecei pelas estações de onda média, pela Renascença, pelo António Sala e companhia, pela voz e pela palavra (era o que a minha mãe ouvia). Mais tarde descobri o FM, a Rádio Comercial, o António Sérgio, o Luís Filipe Barros. Foi esse o "gatilho" que me levou para a rádio, ainda miúdo, aos 13 ou 14 anos, no tempo das rádios piratas.

Tens saudades desses tempos das piratas?

Sim, na medida em que eram tempos de grande liberdade. Tempos que os Podcasts de hoje me fazem lembrar, curiosamente. Embora para mim seja hoje impensável fazer rádio nesses moldes.

Vive-se o mesmo espírito?

Sim, no sentido da liberdade. Quando fazes o que te apetece sem ter de dar satisfações a ninguém, isso é liberdade.

Podcast “igual” a rádios piratas?

Julgo que sim, "ainda".

O "lado B" é o "teu" programa ou o programa "possível"?

Até ver é o meu programa. É um espaço dinâmico, em crescimento. E eu a crescer com ele.

No início deste ano começaste a introduzir novos conteúdos no programa, tornando-o mais dinâmico. Podes desvendar algo mais sobre isso?

Decidi convidar alguns amigos ligados também ao mundo da rádio para produzir conteúdos (sempre relacionados com música). Acho que enriquece o programa. Não sou o único a ter coisas para dizer, e outras vozes no "lado B" confere-lhe outro dinamismo. São um complemento.

Da pouca rádio que actualmente ouves, o que é que não perdes de ouvido?

Um ou outro programa de autor. O “mq3” e o “Coyote” na Antena 3, bem como alguns conteúdos informativos, nomeadamente da TSF. Raramente oiço emissão de continuidade. Oiço por vezes a Radar e a Oxigénio.

E os radialistas que mais gostas, quais são?

Aí está uma pergunta difícil. Quase não existem radialistas. Somos "papagaios" dos outros.
Mas o Miguel Quintão e o Álvaro Costa são uma dupla fantástica, e a Mónica Mendes, uma excelente comunicadora. Há depois bons jornalistas na rádio a produzir conteúdos de grande qualidade.

Simultaneamente animas espaços de continuidade na TSF desde Agosto de 2004. O que dizes dessa experiência?

Tem sido muito enriquecedora. É uma rádio diferente dos formatos a que estava habituado, mas com uma dinâmica muito interessante. Aprende-se muito ali.

O que te parece esta nova lei das quotas de música portuguesa nas rádios?

Parece-me uma idiotice que só visa proteger os lóbies da industria nacional, ou seja, um punhado de artistas que, na maioria, é medíocre em termos de qualidade. O que provavelmente vai fazer prova desta ideia é o facto de muitos bons artistas lusos continuarem "obscuros" no mercado e nas playlists das rádios, se não mesmo, excluídos!

Terminamos como começámos, falando de Podcast. No teu blogue tens uma ligação para esclarecer dúvidas sobre Podcast. Para quem se inicia no processo, o que mais aconselharias?

Aconselharia a pôr ideias em prática. Mais do que questões técnicas, o que faz falta são ideias e conteúdos.

Tens tido bom feedback do programa através da Internet e do Podcast?

Sim, bastante bom. Aliás, devo dizer que o feedback que tenho recebido deriva da audição via Internet. O que é um estímulo para continuar.


lado B
Rádio Ocidente (88.0 FM)
Sábado p/Domingo (00:00/01:00)
Repetição Domingo (19:00/20:00)
Blogue: http://web.mac.com/pedroesteves/iWeb/ladob
Blogue arquivo: http://ladob-arquivo.blogspot.com/
Podcast: http://ladob.libsyn.com/rss

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MAIS PODCAST 2006

Em 2005 a palavra Podcast entrou em definitivo no vocabulário da Internet e no mundo da rádio, não tanto por ser Rádio, mas por poder ameaçar ou favorecer a rádio.
Eu sou daqueles que acreditam que pode favorecer mais do que prejudicar, mas é preciso que a rádio não perca o comboio que está em andamento acelerado.
O Podcasting não é o fim da rádio. É mais uma opção Rádio, com todas as possibilidades de ser mais interessante e estimulante que a rádio tradicional em determinados conteúdos.

P.S: A minha estreia no Podcast aconteceu em Janeiro deste novo ano. Uma curta crónica (“Linhas Cruzadas”) mensal, de cariz musical, no programa “lado B” de Pedro Esteves. Um gentil convite que não quis recusar. Ao autor do programa, públicos e devidos agradecimentos.

Mais: Está disponível na Internet um programa de rádio sobre Rádio.
É no linkComo No Cinema”. Nestes endereços:

http://pwp.netcabo.pt/radiozero/
http://www.radio-zero.blogspot.com/



Francisco Mateus



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