sábado, 6 de novembro de 2010

Palavra de Lobo (V)

Fim-de-semana ANTÓNIO SÉRGIO na «Rádio Crítica»























A ORELHA DE ANTÓNIO SÉRGIO – PERFIL DA VOZ POR TRÁS DO MICROFONE
Da minha língua vê-se o mar. Da minha língua ouve-se o seu rumor, como da de outros se ouvirá o da floresta ou o silêncio do deserto, nenhuma outra citação me vem à memória que melhor defina António Sérgio.

E se considerarem descaramento a utilização das palavras do mestre Vergílio Ferreira, não peço perdão. António Sérgio fez mais pela cultura das duas últimas gerações que muitas escolas deste país. Através da magia sonora, da postura rebelde e sem papas na língua, abriu espaço à divulgação da Arte e criou na sua tribo de ouvintes o estigma do horror à ignorância e estimulou o desejo de partir à descoberta da cultura, nacional e do mundo.

Reservado e solitário, quando entra nas quatro paredes do estúdio de emissão, António Sérgio nunca se alheou da vida ou das gentes, recusando estatutos especiais ou lugares privilegiados. É presença habitual nas salas de espectáculo, seja o cartaz world music, hardcore, dance, rock'n'roll, ou puro rhythm and blues. No meio da tribo, afasta os curiosos da superficialidade, com o seu histórico "feitio". O "abracadabra" para uma gargalhada espontânea passa por uma boa história "on the road". Para lhe captar a atenção basta um "registo" dentro de um envelope (nome e telefone, é obrigatório!) com uma boa canção, um bom riff, uma voz "vibrante" ou um projecto que lhe encha a orelha.

A voz grave ganhou modulações, subtilezas e ressonâncias com o passar dos anos. Falou de esperança quando o abismo parecia tão perto, invocou o espanto e o pavor de viver, evocou os desaparecidos, regozijou-se com o sol e a magia da lua.

A voz por trás do microfone ainda estende o seu manto profundo na habitual despedida: Take Care!
Ana Cristina Ferrão
Dezembro 2001
inlay CD colectânea «Som da Frente 1982-1986»
















The Waterboys – “A Girl Called Johnny” (1983)


O que eles dizem (56)

António Sérgio subiu ao topo da realização radiofónica nas emissoras nacionais, que depois o afastaram; terminou, com a mesma qualidade, numa rádio local.
Diz-se que até hoje nenhum
media morreu por aparecer outro, mas pergunto a mim mesmo que tipo de vida tem a rádio, se a nada aspirar senão à sua própria irrelevância.
Eduardo Cintra Torres
In: «PÚBLICO», Sábado de 07 Novembro 2009



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