quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
A Voz Humana
Art is the revelation of the secret laws of nature wich without it would remain forever hidden
De Jean Cocteau no Teatro Turim (antigo Cinema Turim; Estrada de Benfica, Lisboa) até dia 19 de Fevereiro.
Um monólogo telefónico escrito por Jean Cocteau em 1930, com representação de Ana Moreira, Margarida Cardeal e Raquel Dias.
De visitar também, ao lado da sala, a exposição de fotografia de Karina Jeppesen. São imagens do acompanhamento do processo de criação da peça «A Voz Humana».
O que elas dizem (68):
O sofrimento de amor é transversal – não é exclusivo do sexo feminino – e não constitui vergonha para ninguém. Sim, as pessoas sofrem por amor, e dizem as coisas como estas – que Cocteau escreveu – em privado.
Raquel Dias
Criámos, com a ajuda da Karina, um universo estético que acabou por condicionar a dramaturgia.
Margarida Cardeal
Esta mulher – que nós interpretamos as três, cada uma à sua maneira – usa o seu sofrimento para manipular o amante. Ela exerce chantagem emocional sobre ele... é o seu recurso, e isso é muito óbvio no texto.
Ana Moreira
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O que eles dizem (67):
O telefone na Rádio
Não aconselho a ninguém ouvir muitas horas de fóruns radiofónicos. As vozes na cabeça não se vão embora. Parece ter havido festa grossa na sala mental onde iam as minhas palavras quando queriam estar à vontade.
(...)
A culpa da crise é de todos nós - parece um truísmo. Mas o ouvinte não acredita na crise. Só acredita na crise em que não acredita.
É por estes pensamentos originais que vale a pena ouvir os rádio-fóruns.
(...)
É pena que se não digam só vacuidades nos fóruns. Assim escusávamos de nos darmos ao esforço de traduzir. A verdade é que se dizem coisas interessantes, pouco ouvidas ou bem pensadas. Muitas vezes debaixo do mais pesado jargão ou na forma de desabafos monossilábicos.
Não há relação entre falar bem e ter graça. Havendo regra, são as pessoas com mais graça que se exprimem pior. Seja por tentarem falar caro ou por não terem jeito para falar. Já entre as pessoas que nada têm para dizer ou acrescentar, a maioria sabe falar bem, com irrepreensível clareza.
Os rádio-fóruns são a demonstração desta assincronia. É mesmo preciso traduzir. Ou, quando não há paciência ou generosidade, também é bom ouvir os portugueses a falar como lhes apetece falar. É assim que falamos. É assim a língua portuguesa. Que não é a deles – que é a nossa.
Não é possível mudá-la. Nem é fácil amá-la. Mas há lá qualquer coisa para amar.
Miguel Esteves Cardoso
In: «PÚBLICO»
Sexta-feira, 20 de Agosto 2010
O que eles dizem (66):
O Telefone
O telefone exige uma participação completa da pessoa. Para compreender é preciso captar sons muito baixos, os matizes da voz, do tom. Só assim podemos intuir o estado de espírito do interlocutor, compreender as suas intenções. Ao telefone temos de desenvolver em nós um pouco das virtudes dos cegos, que apreendem a realidade sem a verem com os olhos.
Marshall McLuhan
Ao telefone podemos colher informações que, às vezes, se perdem por entre a grande riqueza dos estímulos de um encontro directo. Porque é como se o outro estivesse concentrado num único ponto, como um escultor. Ou como um esgrimista que, se se distrair por uns instantes, se deixar que um pensamento lhe passe pela cabeça, é tocado.
Ao telefone é difícil exprimir emoções que não se sentem. Por exemplo, as condolências. Indo pessoalmente a um funeral, basta ter os olhos baixos, murmurar umas palavras, fazer um gesto convencional. Por outro lado, a emoção colectiva transmite-se facilmente, faz-nos participar mesmo que estivéssemos indiferentes. Ao telefone, pelo contrário, no diálogo solitário tu a tu, no silêncio absoluto do microfone, só quem está sinceramente emocionado é que sabe o que dizer. As vibrações da sua voz, as pausas, até a respiração, falam por ele.
Ao telefone a bondade de espírito revela-se facilmente. Mesmo que, a princípio, a pessoa generosa seja apanhada de surpresa, ou não se sinta bem, ou até esteja aborrecida, logo a seguir a sua voz se torna milagrosamente suave. Não consegue fazer prevalecer os seus interesses. Pede desculpa por não poder responder, ou por não poder continuar ao telefone. Compreende-se que gostaria de nos ajudar mas que está mal e não pode fazê-lo.
Francesco Alberoni