segunda-feira, 17 de março de 2014

DISCOTECA





















Neste mês de Março em que a Rádio Comercial celebra o 35º aniversário, a memória de mais um dos programas que fizeram a História da Rádio em Portugal.
O programa «Discoteca» começou no Verão de 1981. O primeiro horário era ao Domingo, das 14:00 às 18:00.
Depois, dado o sucesso do espaço da autoria de Adelino Gonçalves, «Discoteca» passou para um horário diário, de segunda a sexta-feira, das 13:00 às 15:00. Foi neste horário que se tornou numa emissão de culto, ainda hoje lembrada por todos quanto a escutaram durante anos a fio no FM da Rádio Comercial
Também contou com as colaborações de José Maria Corte-Real [O Espião Que Veio do Frio], Eduardo Guerra e Darwin Cardoso. Dos vários apontamentos, por exemplo o top Funktastico, o mais apreciado era o Power-Play.
No programa eram divulgadas listas da revista norte-americana Bilboard como a Black Singles, o histórico Hot 100 e ainda o top inglês.
Havia também os destaques que marcavam os dois mercados mais importantes (Londres e Nova Iorque).
Foi o primeiro programa de música de dança a ter grande projecção na Rádio nacional, num período em que o país estava musicalmente dominado pelo chamado ‘boom’ do Rock português.
Adelino Gonçalves, voz de ouro, era então um jovem de vinte anos de idade. Mostrou-nos o que mais ninguém mostrava na altura: boa música negra, dançável. Mas não só. «Discoteca» foi um programa ponta-de-lança na Rádio. Inovador e moderno.


Extractos de uma entrevista de Adelino Gonçalves ao jornal PÚBLICO em Janeiro de 2003: 

Eu estava a fazer o Contacto na onda média [da Comercial] e o Jaime Fernandes queria que eu fosse para o FM. Havia um espaço ao domingo à tarde, de quatro horas, e que era um alternativa ao Passeio dos Alegres, do Júlio Isidro, na RTP1, e aos relatos de futebol. 
(…)
Decidi experimentar num espaço tão longo a música que só se ouvia nas discotecas, que as pessoas tinham que ir às discotecas ou 'boîtes' para dançar e tomar conhecimento, porque não se ouvia em rádio. Achei interessantíssimo, era um filão, e que se adaptava à experiência. 
(…)
Não havia música. Havia um circuito de importação para os DJ, muito restrito, um bocado à candonga, porque era contra a lei... E eram preços exorbitantes, vinham coisas da América, algumas de Londres. Fui ter com alguns DJ e disse: 'Eis uma óptima ideia para fazer um programa – música negra em todas as vertentes, soul, funk.' E nos primeiros programas socorri-me do José Maria Corte-Real e do Darwin Cardoso. E foram passando a palavra e foi-me chegando muita música. 
(…)
Não queria fazer um programa como os outros. Queria fazer divulgação, comecei a fazer pesquisa, pedia informação às editoras dos artistas lá fora, lá me punha a fazer grandes especiais. 

E assim criou público que não havia? 

Havia um público que ia ao Charlie Place, ao Antigo Charlie Brown, ao Bananas, os frequentadores das discotecas, e que gostavam de ouvir essa música na rádio; e criei um novo tipo de ouvintes, que era a malta que não estava sintonizada com esse tipo de música e que passou a ouvir o programa. Foi ao contrário: começou a ouvir o programa e depois a ir à discoteca. 

E agora?

Não sou um revivalista militante. Acho que nos anos 80, na música negra havia muito mais por onde escolher, quer fosse a soul music, a mais tradicional, a mais ortodoxa, quer fosse o funk com raízes no jazz, quer fosse a mais deliberadamente de dança. Em muitas situações agora há 'déjà vu'. Por exemplo, Morcheeba... já ouvi isto. O próprio Robbie Williams, com o 'Rock DJ', foi buscar a métrica ao 'Saddle up', do David Christie. 

Terminada a década de 80, Adelino desapareceu...

Passei pela Rádio Energia. A ideia do Luís Montês [director] era eu reformular a música, porque aquilo vinha com alguns vícios metaleiros. Fui à experiência, e não queria ficar com o odioso de impor às pessoas que tinham transitado o meu gosto e ao fim de um ano preferi ir embora. E aí acabou a rádio. 

Está desiludido com o rumo que a rádio em Portugal tomou?

Completamente. Perdeu-se a personalidade, não há espaço. Não quero com isto dizer que não deva haver rádios onde se siga a 'playlist' - mas não apenas a 'playlist'. E dentro dela poder-se personalizar. Era esse o encanto, o 'opinion maker'. A voz que está na rádio A é igual à da rádio B. Há colegas que se queixam, as directrizes são no sentido de falar o menos possível. 

In: PÚBLICO, Suplemento Y
Eurico Monchique
10 de Janeiro 2003 


Em 2002 foi editada uma colectânea dupla, em CD, com alguns dos mais emblemáticos temas divulgados pelo programa, incluindo “On The Beat” do colectivo nova iorquino The B.B. & Q. Band.



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