terça-feira, 7 de maio de 2019
Palavras de há 5 anos na Íntima Fracção
A
assinalar os 35 anos do programa «Íntima
Fracção» de Francisco Amaral, alguns dos textos pertencentes à emissão do trigésimo
aniversário – há cinco anos – no dia 8 de Abril de 2014, numa edição publicada no
EXPRESSO-online.
A primeira coisa que há a dizer, trinta anos depois, é a de
que o Tempo é o único escultor.
O que aprendi foi que
a intimidade se refere à perspectiva sonora dos ouvintes. O que desejam é
experimentar uma sensação de proximidade com a música, com a voz. Como se
estivéssemos numa pequena sala. A ausência de intimidade responde a um sentimento
de distância e separação, como se estivéssemos numa grande sala.
Interrogações tardias, falta de vocabulário. O desenho das
frases é previsível. O coração serve para reter a Vida. Já se receberam os elogios,
os agradecimentos que julgáramos merecidos. Não se esperavam lágrimas
coloridas, explodindo no céu? Não se esperava nada. Talvez, primeiro, o
esquecimento., a leveza. E depois, o caminho já passado e impossível de saber
se era o exacto. Não há exactidão alguma. Um círculo fecha-se e essa é a
inultrapassável exactidão.
(…)
Em todo o lado há marcas, ruínas, condutores perseguidos por
linhas incandescentes no frio seco da noite. As rádios transmitem para a intimidade.
Os condutores cruzam olhares, animais feridos. Atiram cigarros para trás das
costas. Prosseguem a viagem acelerando. Parece não haver alternativa à vida.
A Música é a mais espiritual de todas as artes e é, por
excelência, a arte da memória. Existe apenas quando um cantor ou um
instrumentista a faz viver. E é, então, com a beleza de uma voz ou a vitalidade
de uma dança, embriagando-nos os sentidos, que se consubstancia no nosso
pensamento intentos mas fugidios instantes que trazem paz e alegria, ou ternura,
e nostalgia aos nossos corações.
Como passamos para segundo plano? Como cai o pó? Quando se
começa a perder? Primeiro, sou príncipe. Herdeiro do Mundo. Subitamente, outro.
Deposto e andrajoso. Olho-me ao espelho. Uma cara, vagamente a minha. Com
marcas de um tempo que não foi o meu. Na verdade, não estou mais perdido do que
antes. Apenas mudei de bairro.
30º aniversário da «Íntima Fracção» aqui