sexta-feira, 22 de novembro de 2019
Crematística
Crematística: A prática crematística consiste em colocar a procura da maximização da rentabilidade financeira na forma de acumulação de numerário antes de qualquer outra coisa, em detrimento, se necessário, dos seres humanos, dos relacionamentos afectivos, profissionais, sociais e do meio-ambiente. É da natureza da prática crematística recorrer a diversas estratégias de acção nocivas.
"A sociedade e a cultura em que vivemos exigem que o
estudante seja orientado para um emprego e uma segurança material. Tem sido
essa a pressão constante das diversas sociedades: a carreira primeiro, e tudo o
mais secundariamente. Isto é, primeiro o dinheiro, passando para segundo plano
os aspectos complexos da nossa vida diária. Estamos a tentar inverter esse
processo, porque só o dinheiro não pode fazer o homem feliz. Quando o dinheiro
se torna o factor dominante na vida, há desequilíbrio na nossa actividade
quotidiana. Assim, se me permitem, gostaria que todos os educadores
compreendessem isto com muita seriedade e vissem bem todo o seu significado. Se
o educador compreender a importância disto e lhe der na sua vida o lugar
adequado, será então capaz de ajudar o jovem, que é levado pela sociedade e
pelos próprios pais a fazer da carreira a coisa mais importante. Gostaria,
pois, com esta primeira carta, de acentuar este ponto, para que nestas escolas
se mantenha sempre um modo de viver que ajude a cultivar o ser humano na sua
totalidade. A maior parte da educação que recebemos consiste na aquisição de
conhecimentos, o que está a tornar-nos cada vez mais mecânicos; as nossas
mentes estão a funcionar em caminhos rotineiros e estreitos, quer o
conhecimento que adquirimos seja científico, filosófico, religioso, comercial
ou tecnológico. A nossa maneira de viver, em casa ou fora dela, e a nossa
especialização numa profissão determinada tornam as nossas mentes cada vez mais
estreitas, limitadas e incompletas. Tudo isto leva a um modo mecânico de viver,
a uma mentalidade que se ajusta a padrões, e assim gradualmente o Estado, mesmo
um Estado democrático, dita aquilo em que deveremos tornar-nos. Muitas pessoas
dadas à reflexão têm naturalmente consciência disso, mas infelizmente parecem
aceitar viver assim. E isso torna-se um perigo para a liberdade. A liberdade é
algo muito complexo e para compreender essa complexidade é necessário o pleno
desabrochar da mente. Cada um, como é natural, dará uma definição diferente do
que entende por desabrochar do homem, de acordo com a sua cultura, a forma como
foi educado, a sua experiência, as suas crenças religiosas — isto é, de acordo
com o seu condicionamento. Não nos ocuparemos aqui de opiniões ou preconceitos
mas sim de uma compreensão, para além das palavras, das implicações e
consequências do completo desabrochar da mente. Esse desabrochar é o total
desenvolvimento e cultura da mente e do coração, e também o bem-estar do corpo,
o que significa viver em completa harmonia, sem oposição ou contradição entre
eles. O pleno desabrochar da mente só pode acontecer quando há percepção clara,
objectiva, impessoal, livre de qualquer espécie de imposição. Não se trata de o
que pensar mas de como pensar 18 lucidamente. Há séculos que por meio da
propaganda e de outras influências, temos sido orientados para o que pensar. A
maior parte da educação moderna é isso, sem uma investigação de todo o
movimento do pensamento. O desabrochar implica liberdade: como uma planta, a
mente precisa de liberdade para crescer. Abordaremos isto de maneiras diversas
nestas cartas, durante o ano que vai começar: trataremos do acordar do coração,
que nada tem a ver com sentimentalismos, romantismo ou imaginação, mas com a
bondade que nasce da afeição e do amor. Trataremos da cultura do corpo, da
alimentação correcta e do exercício adequado, criadores de uma sensibilidade
profunda. Quando a mente, o coração e o corpo estão, os três, em completa
harmonia, então o desabrochar acontece naturalmente, de maneira fácil e em
plenitude. É este o nosso trabalho como educadores, é esta a nossa
responsabilidade, e a profissão de educar assume então na vida toda a sua
grandeza."
J. Krishnamurti
In: «Cartas às Escolas»
Excerto da obra no espaço de divulgação literária «Última Edição», incluído na parte final do programa «A Ronda da Noite».
O Conhecimento e a Cultura no mais belo e interessante programa diário da actual Rádio portuguesa.
A Ronda da Noite
Antena2
18 de Novembro de 2019
Realização e apresentação de Luís Caetano
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